Guerra Civil - O dia que o morro descer e não for Carnaval



Dizem que os poetas são uma espécie de antena da raça humana. Captam o que, embora ainda não perceptível aos olhos, já circula no ar. Mais ou menos como os profetas, que, no entanto, não têm compromissos com a métrica e o ritmo.
O poema abaixo é de autoria de Paulo César Pinheiro, poeta e parceiro de todos os gigantes da MPB nos últimos 40 anos (Baden Powell, Tom Jobim, Edu Lobo, Dori Caymi, Elizeth Cardoso, Clara Nunes – com quem foi casado, etc...).
Foi escrito há quase 20 anos e foi gravado pelo compositor e percussionista Wilson das Neves, num CD que é hoje raridade. É um retrato premonitório do que está acontecendo hoje nas principais cidades brasileiras, principalmente no Rio de Janeiro, a guerra civil não declarada, guerra que as “autoridades” não gostam de divulgar, mas que mata vários inocentes todos os dias.
Nenhum projeto ou iniciativa no campo da política e da economia fará sentido atualmente, se não levar em conta a realidade que o poema expressa.

"O dia em que o morro descer e não for carnaval"

O dia em que o morro descer e não for carnaval
Ninguém vai ficar pra assistir o desfile final
Na entrada, a rajada de fogos, para quem nunca viu,
Vai ser de escopeta, metralhadora, granada e fuzil!
(É a guerra civil...)

O dia em que o morro descer e não for carnaval
Não vai nem dar tempo de ter o ensaio geral
E cada ala da escola será uma quadrilha
A evolução vai ser de guerrilha
Que a alegoria é um tremendo arsenal
O tema do enredo vai ser a cidade partida
No dia em que o couro comer na avenida
Se o morro descer e não for carnaval.

O povo virá de cortiço, alagado e favela
Mostrando a miséria sobre a passarela
Sem a fantasia que sai no jornal.
Vai ser uma única escola, uma só bateria
Quem vai ser jurado? Ninguém gostaria
Que desfile assim, não vai ter nada igual.

Não tem órgão oficial, nem governo, nem liga
Nem autoridade que compre essa briga
Ninguém sabe a força desse pessoal
Melhor é o poder devolver pra esse povo a alegria
Senão todo o mundo vai sambar no dia
Em que o morro descer e não for carnaval.


Existe retrato mais atual do Rio de Janeiro do que esse?

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